Primavera Silenciosa: curadoria de Alexia Tala

7 Outubro - 20 Dezembro 2023
Apresentação
Primavera Silenciosa baseia-se em uma pesquisa curatorial focada na arte produzida por artistas indígenas da América Latina, e propõe uma coexistência com outras expressões artísticas que estão profundamente enraizadas em tradições ligadas aos lugares aos quais pertencem. A poética criativa dos artistas da exposição celebra a pluralidade e a atenta relação de escuta com a natureza, ao mesmo tempo em que mantém aberto um espaço para o olhar crítico. As obras pretendem fortalecer as nossas formas de ver e viver o mundo, incentivando assim uma relação sustentável com o ambiente, que não é nova, senão ancestral, mas que muitas vezes tem sido silenciada.
 
Em 1962, Rachel Carson publicou um livro, Primavera Silenciosa, sobre os efeitos nocivos da poluição agroquímica que, além de seus estudos científicos, criou uma alegoria que vislumbrava como as ações e comportamentos sociais afetam os ciclos da natureza. Essa publicação dá título a esta exposição, que tomando como ponto de partida a visão de Carson, articula três eixos. Um central, que trata das diversas formas como os artistas falam sobre assuntos sagrados, preservação e regeneração diante do caos e dos desastres ambientais, ao mesmo tempo que o onírico se faz presente como forma de ver o invisível. Aqui, o conhecimento transmitido oralmente de geração em geração encontra forma de manifestação na prática da arte. Devido ao contexto de suas experiências, esses artistas tendem a desenvolver obras com notável densidade simbólica e suas pesquisas revelam componentes de importância histórica ao registrar suas ancestralidades e suas relações com o meio ambiente. O segundo eixo aborda questões de exotização, racialização, extermínio e silenciamento dos povos indígenas, os quais têm sofrido com tentativas de extermínio e, junto com eles, extinguir também suas visões de mundo e saberes, tão ligados à natureza. Por fim, um terceiro eixo trata do extrativismo da terra, da privatização da água, das doenças, da acumulação e reciclagem de resíduos e da industrialização, produtos do Capitaloceno que Andreas Malm descreve bem como “a geologia não da humanidade, mas da acumulação de capital”, apontando-a como a principal causa da crise ambiental.
 
Por fim, a exposição convida-nos a pensar sobre os gatilhos que levaram a uma inflexão ambiental: o devastador Capitaloceno e o extermínio racial das comunidades indígenas. Os exercícios de reflexão propostos por Primavera Silenciosa questionam até onde pode chegar essa coexistência: se toda a humanidade tivesse adotado o mesmo respeito pela natureza que as cosmovisões indígenas, estaríamos hoje nesta situação antropocênica? Quando conseguimos ouvir, ver e sentir o mundo inteiro com mais clareza, e conseguimos identificar a importância que há em cada gesto, em cada marca deixada por cada ser, nos vemos simplesmente como um entre milhões, com uma capacidade limitada e quase insignificante de ação? Ou, pelo contrário, abraçamos a nossa capacidade de impacto como parte de uma coletividade e confrontamos o poder das nossas próprias ações transformadoras?
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