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PAULA GARCIA
CORPO RUÍDO
23.11 - 20.12.2024
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A arte de Paula Garcia é antes de tudo um convite radical à presença física, mental e espiritual. Seus movimentos intentam um enfrentamento às forças que regem os passos humanos numa guiança compulsória, vívida e frutificada a partir de ruídos férreos envolvidos por gemidos de exaustão.O que se anuncia possui a energia de um exército concentrada numa massa corpórea, contraditoriamente industrial, que floresce, e se transfigura, em moitas de aço. Um super-corpo construído nos sonhos, e assombros, de infância da artista; que não apenas tem na ação o elemento mais importante em sua prática, mas que principalmente busca refletir sobre o que está intrínseco nesta ação.Paula organiza uma série de feituras que versam sobre os conceitos metafóricos e físicos que o ímã representa, como, por exemplo, atração e repulsão. Ela intui elaborações sobre a capacidade do ímã de atrair metais específicos e reflete sobre os conceitos de afinidade, identidade e essência. Em metafísica, isso pode ser comparado ao modo como certas ideias ou entidades têm uma "atração natural" por outras, cogitando sobre o que significa ser ou existir em relação a outras coisas.
Para pensar nessa relação, ela parte do corpo, do ruído e da arte, por meio de performances de longa duração em que dispõe a si mesma, como um totem, e se volta a um ensimesmar escultórico. A importância estética do seu trabalho se faz evidente como fosse até mesmo uma pintura, repleta de gestos demasiadamente pesados, densos, e dispendiosos que coloca a prova um corpo que insiste em resistir. Paula se preocupa com a qualidade da experiência para o público. Este ponto se revela através de sua presença, direção e atenção que se tornam evidentes em absolutamente todos os segundos de suas performances. A artista entende que esse lugar plástico traz uma expansão para seu trabalho; é a materialidade com gestos coreografados numa poesia visual que extravasa a potência dramática.
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P A U L A G A R C I A“#9 Corpo Ruído”, 2023
documentação em vídeo da performance realizada no Southbank Center em Londres por 30 horas em 5 dias
video documentation of the performance held at the Southbank Center in London for 30 hours over 5 days
duração: 20’
duration: 20'
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Por compreender que a arte deve modificar a nossa identidade, pensa também sobre o ato de transmutação do organismo material do ser humano, a identidade disseminada no corpo. Ao buscar na história da arte os elementos, conceitos e as experiências que contextualizam sua prática artística, elabora um projeto ambicioso que sonda e manipula as sobras de uma civilização forjada no ferro e nas forças de opressão. Encara o imã não apenas como objeto, mas como uma representação das forças visíveis e invisíveis: as relações humanas, os sistemas de controle sócio-políticos que, em sua trajetória, são revelados por meio de noções muito particulares sobre o magnetismo.A artista tem a escola vanguardista da cena da performance como raiz de sua jornada. Isso se deu a partir de uma profunda relação com o MAI - Marina Abramović Institute, entidade dedicada ao trabalho de longa duração. Suas ações, portanto, sugerem a inserção do público na experiência estética de exploração do corpo e do risco como forma de expressão artística e de confrontação dos conflitos que perpassam a realidade.Em sua primeira individual, Paula apresenta um conjunto de trabalhos que aglutina sua experiência, dos últimos vinte anos, junto ao desenvolvimento de ações experimentais nos campos da curadoria e produção. Por meio de registros e documentos de performances - compostos de fotografia, vídeo-arte e obras instalativas - exibe quatro obras que carregam a energia d’um universo mito-poético de urdiduras colossais. Performances que utilizam linguagens em que a tensão e o conflito são materializados numa estrutura coberta por forças palpáveis e abstratas. É esse tipo de campo que Paula denomina “Corpo Ruído”.
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Os sons surgem como elementos muito presentes e determinantes, tornando o trabalho robusto. A microfonação, o ajuntamento e escoamento dos ruídos captados se alinham de modo que o material resultante desses processos se constitui como arte sonora. São peças de sons ruidosos adornadas pelo barulho de ferro batendo com ferro; estardalhaços agudos, de difícil digestão, que invadem a epiderme do público num violento rumor de um corpo que pende, que enverga, mas que permanece e respira. Essa sonoridade nasce do atrito entre os materiais com os quais Paula trabalha e que funcionam como corpos que detonam um outro corpo.A agonia das marcas roxas, dos pontos costurados na carne da artista, levam ao entendimento da exaustão e do descanso como simbologias da inteireza. Estas imagens têm efeito magnético no público. Pelo seu contrário, também apresenta-se o impacto nos momentos de descanso e nutrição: a água, o alimento, o suor lavado, tudo ganha outra compreensão e nos leva a uma imaginação que faz severas críticas à arte que não se inclina ao risco. Tudo isso revela a centralidade de estados alterados de consciência na performance, uma vez que, a partir dessa condição, Paula consegue desafiar os limites carnais e criar "obras de transe".A intensidade do trabalho é fundamentada na presença, uma presença radicalizada em atenção total no agora. Por isso, sua atenção se volta às experiências brutais de trabalho em que, por horas e horas, exige dedicação do corpo ao ofício, isso a leva a fazer uso da própria matéria humana como sujeito e objeto, tema e meio de expressão.
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A coisa bruta, o peso, o uso da força traduzem a performance em algo que seja plástico. É quando os esforços da artista ganham ares mais ambiciosos e desembocam em projetos audaciosos, complexos em verba e realização como Cru/Raw, configurando um momento de maturação. Por isso, talvez a característica mais significativa de seu trabalho seja o fato de elaborar com e no limite. Em vários exemplos nota-se a tentativa persistente de lidar com aquilo que se localiza no extremo: a dor, o corpo, os equipamentos, o experimentalismo e até a própria arte. É uma ação contínua que visa o êxtase pela extrapolação dos limites. Nesse caminho, Paula debate as construções do gênero, da força humana, das políticas internas e externas.Ela nos diz, a todo instante, que o corpo age como ferramenta política de descentralização da noção estável que temos da corporeidade. Nos mostra que a voz vinda dele combinada com os ferros dentro do espaço, é o ruído. O tempo se torna um elemento central, com a artista muitas vezes desafiando as percepções convencionais de duração e ritmo. Isso resulta em uma experiência meditativa e ativa tanto para Paula quanto para o público, e questiona as normas estabelecidas sobre a arte e a experiência estética.
Nesse contexto, aponta para uma corporalidade radical definida pela interseção de ao menos três fatores: precariedade, incerteza e risco. Seja na obra Cru/Raw ou nas obras que compõem a série Corpo Ruído, a artista parece querer realizar o impossível e romper limites, buscando equilíbrio em instantes de instabilidade extrema. De modo sensorial, a relação entre perigo e alteração dos sentidos, tão ambivalente, por um lado nos mostra que toda e qualquer situação que exija dos sentidos e do corpo, algo que fuja de suas atividades ordinárias, será necessariamente experimentada como arriscada e perigosa. Por outro lado, Paula Garcia nos mostra que a exposição ao abismo é algo que impele o corpo a utilizar os seus sentidos de uma forma não cotidiana, rumando ao campo do extraordinário.
Natalia Grilo
2024
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P A U L A G A R C I A“CRU/RAW”, 2020-2024
documentação em vídeo da performance realizada na ARCA em São Paulo
video documentation of the performance at ARCA in São Paulo
duração: 9’30”
duration: 9’30”
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Paula Garcia
1975, São Paulo, Brasil. Vive e trabalha em São Paulo, Brasil.Para Paula Garcia, a performance é sobre estado mental, instinto e pele. O interesse pelo corpo já havia levado a artista a estudar teatro antes mesmo de se embrenhar nas artes visuais. Situações de embate e os limites do corpo são temas que permeiam a pesquisa de Paula Garcia, que tem a performance sua principal forma de expressão, além de considerar o vetor ideal para trabalhar as sensações e os sentidos. Em suas performances, o tempo e o som muitas vezes são agentes catalisadores para criar conexões entre o corpo e o mundo, construindo resultados que permanecem como instalações residuais.
Com graduação em Artes Plásticas pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), em São Paulo (Brasil), mestrado em Artes Visuais pela Faculdade Santa Marcelina, em São Paulo (Brasil) e, no momento, realiza doutorado em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Paula Garcia também estudou teatro pelo Michael Howard Studio, em Nova York (EUA) e Teatro Escola Célia Helena, em São Paulo (Brasil). Algumas das suas principais participações aconteceram em SouthBank Centre's Queen Elizabeth Hall (2023, Londres, GB), Pinacoteca do Estado de São Paulo (2023 e 2021, São Paulo, Brasil), Galpão Vídeobrasil (2016, São Paulo, Brasil), Sesc Pompéia (2015, São Paulo, Brasil), Beyeler Foundation (2014, Basel, Suíça), 7a Bienal El Museo del Barrio (2013, Nova York, EUA), Watermill Center (2012, Nova York, EUA), etc. Em 2012, participou do International Summer Program pelo Watermill Center (Nova York, EUA).