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Pince-nezLíngua morta,pétala ou carne.O forno do povona aldeia — o padeirona cidade.Uma borboletano nariz — culturacaída em desuso.
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A pesquisa de André Sousa explora os artifícios da pintura num campo expandido da prática artística. “Pince-nez”, sua primeira exposição individual no Brasil, reflete a essência da pesquisa do artista português nos últimos anos, principalmente por meio da instalação site-specific homônima, peça chave da mostra. A obra foi pensada para a sala de estar da antiga residência, travando um diálogo direto com a arquitetura modernista de Rino Levi. O título “Pince-nez” foi inspirado neste objeto marcante utilizado pelo personagem Quaresma no romance “Triste Fim de Policarpo Quaresma”, de Lima Barreto. Na obra, tão necessário quanto antiquado, o pince-nez caracteriza simbolicamente o personagem, que vive o dilema de uma cultura em decadência. André Sousa estabelece uma relação entre essa transição de paradigmas e as movimentações nomáticas ou migratórias, lembrando a importância da sociedade junto aos fornos comunitários das aldeias (também do interior de Portugal), que se esvaziavam rumo às grandes cidades. “Pince-nez” (2022-23), localizada próxima a lareira da Sala Modernista, carrega justamente a subjetividade de espaço comunitário e agregador, convocando línguas mortas, borboletas e pétalas de flores raras.Ao adentrar a Sala Modernista, o visitante logo se vê envolvido em uma grande tenda de tecido, presa a partir dos dois lados opostos e erguida pelo seu centro. Num primeiro momento, o material leve de algodão 100% contrasta com a arquitetura robusta e formalista do projeto de Rino Levi. A estrutura funcional da tenda (abrigo e proteção) toma o lugar da edificação Modernista da casa, devolvendo o jardim à floresta e fazendo da lareira, uma fogueira a céu aberto, ou mesmo aludindo ao forno comunitário.Por sua transparência e movimento, o longo tecido que paira sobre as cabeças logo convida os visitantes a uma interação com os jardins de Burle Marx. Com quase dez metros de comprimento, a peça foi toda pintada e costurada a mão por André Sousa, em seu estúdio em Portugal: elementos abstratos e figurativos, que convivem em harmonia e atravessam os conceitos abordados por sua pesquisa, como símbolos geométricos, objetos diversos (tabuleiros de xadrez), paisagens e elementos naturais (floresta, cascata e o fogo).“Pince-nez” reúne ainda um conjunto de cinco pinturas de menor dimensão inéditas, que ao mesmo estilo da instalação, receberam camadas bem aquosas de tinta acrílica. O imaginário das pinturas da grande instalação da tenda é complementado com as paisagens naturais da série “Rede” (2023), mito-paisagens com redes esticadas entre árvores.
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André Sousa
1980, Porto, Portugal. Vive e trabalha em Porto, Portugal, e Frankfurt, Alemanha.O artista português André Sousa trabalha a pintura no campo expandido, por meio do contraste estético e formal. Elementos abstratos e figurativos convivem em harmonia – símbolos, geometria, letras e outras figuras que fazem referências tanto aos códigos de expressão do ser humano, quanto às suas experiências pessoais, alusões literárias, paisagens naturais, arquitetura etc. Apesar de trabalhar uma diversidade de materiais, como madeira e o papel, o tecido tem sido uma das mídias mais utilizadas pelo artista, que geralmente parte de um estudo rigoroso do plano pictórico para abrigar camadas e camadas da diversidade de sua temática.André Sousa tem formação em pintura pela Faculdade de Belas Artes, Universidade do Porto, Portugal (2003). Dentre as exposições individuais estão as apresentadas na Galería Bacelos (2017, Madrid, Espanha), Galeria Múrias Centeno (2017, Porto, Portugal), Panorama Boa Vista (2016, Porto, Portugal), Laboratório das Artes (2015, Guimarães, Portugal), Kim? Contemporary Art Centre (2012, Riga, Latvia), FMAM (2012, Porto, Portugal). Dentre as coletivas estão as do Fosun Foundation (2018, Xangai, China), Kunsthalle Freeport (2018, Bangkok, Tailândia, e 2017, Atenas, Grécia), Museu Coleção Berardo (2016, Lisboa, Portugal), Bienal de Fotografia (2016, Vila Franca de Xira, Portugal), Museu de Arte Contemporânea de Serralves (2014, Porto, Portugal). Participou das residências artísticas na Casa do Povo (2016, São Paulo, Brasil), Kunstlerhaus Bethanien (2009, Berlim, Alemanha) e Fundação Calouste Gulbenkian (2007, Spike Island, Bristol, GB).
André Sousa: Pince-nez
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